Contos

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O Estudante

Quando o fortuito se tornou estratégia?

Cauê não sabe. Só sabe dizer que tudo começou quando ouviu falar de Macbeth.

Eram doutorandos, todos mais velhos do que ele, um mero graduando de início de curso. Se reuniam nas noites de sexta, para a pizza, o chope e, sobretudo, falar dos textos do mundo.

Quando Cauê se juntou ao grupo pela primeira vez, convidado por alguém mais atento ao garoto do fundo da classe que não lanchava nos intervalos, espantou-se diante de tanta paixão pelas palavras. Gostou de não precisar pagar pelo consumo e retardou a hora de dormir no sofá da sala com a luz da TV sem som para o irmão assistir a séries com legendas.

Pouco falava. Sorria, molhando os lábios no chope quase morno, adiando o fim do copo. Não queria abusar do convite, aumentar muito a conta, além de preferir a caipirinha preparada pela mãe nas festas no quintal da casa no subúrbio.

Um dia, alguém começou a falar do surgimento do sujeito moderno, de como Macbeth representava o conflito entre o desejo e a ação, a culpa e o medo cerceando esse desejo. Outra retrucou ter sido Lady Macbeth quem instigou o general a agir. Foi confrontada por um professor de ar cansado: “Mas coube a ela admitir o horror de se ter o sangue de outro nas mãos.”

Em um silêncio criado por todos os copos dirigidos ao mesmo tempo às bocas, acaso pouco usual, Cauê pôde ser ouvido ao falar baixo, como quem recita.

— “Quem poderia adivinhar que o velho tinha tanto sangue dentro das veias?”

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